domingo, 28 de fevereiro de 2010

125 - OVO COZIDO





           Após permanecer várias décadas na árdua atividade agropecuária, José Tomaz Lemos, de apelido Zuza, resolveu estabelecer uma pequena bodega em sua casa, na sede da sossegada vila de Mangabeira.

          Na trabalhosa atividade comercial, Zuza Lemos manteve a mesma desenvoltura, bom humor e espontaneidade que marcaram sua vida.

         Certa manhã, uma mulher chegou ao seu estabelecimento e pediu um quilo de “feijão de corda*”. Quando o comerciante terminava de embrulhar o pedido, a desconfiada cliente perguntou:

           - Seu Zuza, esse feijão é bom mesmo?

           - Bom demais! Cozinha que só ovo. – Respondeu o velho bodegueiro.

           No dia seguinte, logo cedo, a cliente, “soltando fogo pelas ventas”, voltou ao estabelecimento:

           - Seu Zuza, o senhor me engabelou. Disse que o feijão era bom, que cozinhava igual ovo. Esse feijão num presta não. Passou duas horas no fogo e continuou duro que nem pedra.

           O comerciante, pendurando uma corda de cebolas, de imediato replicou:

            - Oxe, e ovo não é assim não? Quanto mais cozinha mais fica duro.



* nome popular do Vigna unguiculata, feijão predominante no interior nordestino

Colaboradora: Eliomar Gonçalves de Lemos Gomes.

(imagem Google)

sábado, 27 de fevereiro de 2010

124 - ZUZA LEMOS





            O distrito de São José pertence ao Município de Lavras da Mangabeira, mas em razão da proximidade também possui estreitas relações com a vizinha cidade de Várzea Alegre.

           Naquele pacato e acolhedor distrito lavrense o agricultor José Tomaz de Lemos viveu por mais de noventa anos. Zuza Lemos, como popularmente conhecido, homem honesto e trabalhador do sertão cearense, marcou especialmente pelo seu humor refinado e sua imediata e inteligente capacidade de reagir a uma situação inesperada.

           Certa manhã, logo ao acordar, Zuza Lemos abria a porta da sua casa quando “deu de cara” com uma jovem e saudável mulher com a mão direita estendida:

          - Seu Zuza, me dê uma esmola. Hoje ainda não comi nadia.

          O agricultor, ainda abrindo a porta, respondeu:

          - Também não deu tempo. O dia começou agoria.



Colaboradoras: Luiza Gonçalves de Lemos Galindo (Luzinete) e Eliomar Gonçalves de Lemos Gomes.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

123 - A ARTE DA GUERRA





           Há mais de dois mil e quatrocentos anos o chinês Sun Tzu escreveu A Arte da Guerra. Em várias épocas, seus ensinamentos de estratégias bélicas serviram para orientar batalhas históricas, como as lideradas por Napoleão, Hitler e Mao Tsé Tung. Mas hoje, outras áreas do conhecimento, inclusive a economia e a administração de empresas, utilizam os ensinamentos da obra milenar.

            Em Várzea Alegre, na região centro-sul cearense, na década de sessenta, Antônio DuVirgem se tornou conhecido por sua perigosa mania de atear fogo em tudo que aparecia a sua frente. Certo dia, no sítio Sanharol, um grande cachorro atacou ferozmente e mordeu a perna do incendiário.

           Decorridas algumas semanas, Antônio DuVirgem se deparou novamente com o feroz animal. Mas dessa vez o cão descansava de barriga para cima na sombra de um pé de cajarana. Antônio não se utilizou do fogo. Pisando macio, apanhou uma “banda de tijolo” e atirou com força contra seu desafeto. O animal saiu em desabalada carreira, mancando e latindo: cain, cain, cain...

          Antônio DuVirgem, com sua distorcida lucidez, encarnando uma das estratégias de guerra do grande militar chinês Sun Tzu, resmungou:

           - “Bandala Fomenga”!!!! Quem tem inimigo não dorme.





Colaboradores: César Júnior e Francisco de Assis(Tico de Mané de Vó).

domingo, 21 de fevereiro de 2010

122 - BLOG DE ANIVERSÁRIO


          
           É momento de soprar velinha e dividir o bolo com todos os inúmeros leitores, colaboradores e comentaristas.

           Hoje, 21 de fevereiro, Pedra de Clarianã completa um ano de existência. Nesses 365 dias apresentou 121 postagens, foi visitado 11568 vezes e recebeu 247 comentários. Criado para contar histórias leves e descontraídas, o blog mantém o compromisso e reafirma o desejo de continuar divertindo os leitores com histórias pitorescas do nosso povo.


sábado, 20 de fevereiro de 2010

121 - OVERDOSE DE CAMISINHA




          Muito embora as doenças sexualmente transmissíveis existam desde o início dos tempos, o uso dos preservativos só se disseminou no fim do século passado. Com a morte de milhares de pessoas provocada pela “Aids”, o mundo despertou para a necessidade do uso da “camisinha”.

         Os governos mantêm campanhas permanentes de conscientização sobre a importância do uso dos preservativos. E durante os festejos do carnaval ocorre um incremento na distribuição gratuita.

          Em Várzea Alegre, na década de 90, a folia se concentrava principalmente no Calçadão Antônio Costa. O próprio secretário de saúde municipal, doutor José Iran Costa, bebendo cerveja no bar de Dinha e Saraiva, se encarregava de distribuir os preservativos aos empolgados foliões.

          Já na madrugada da quarta-feira de cinzas, doutor Iran ofereceu uma tira de camisinhas a Darlan Fiúza. O empolgado carnavalesco, “pra lá de Bagdá”, reclamou:

           - Doutor Iran, não dá para o senhor começar a distribuir muié, não? Já tou com os bolsos cheios de camisinha e ainda não comi ninguém.


Colaboração: Klébia Fiúza

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

120 - RETIRO MOMINO





          Na década de oitenta, o Clube Recreativo de Várzea Alegre – CREVA – promovia quatro bailes de carnavais. A folia, iniciada nos desfiles matutinos de irreverentes blocos e organizadas escolas de samba, culminava com os concorridos eventos noturnos do tradicional clube da cidade cearense.

         Contudo, no ano de 1987, o jovem bancário Júlio Bastos, após certa resistência, aceitou o convite de Dalva e foi passar os feriados mominos em Fortaleza. Na verdade, Dalva pretendia afastar seu querido irmão dos ambientes festivos. Júlio andava exagerando no consumo de bebida alcoólica, preocupando bastante sua família.

          Desse modo, para tranqüilidade dos seus pais, naquele ano, o bancário fugiu da agitação, curtindo programas alternativos e saudáveis na capital alencarina. Porém, como trabalharia a partir do meio-dia da quarta-feira de cinzas, na noite de terça viajou de volta.

          Às quatro horas da madrugada chegou a Várzea Alegre. Já em casa, se preparando para dormir, Júlio escutou os acordes dos Originais do Frevo vindos do CREVA: taran, taran, taran, taranranranran. Foi o suficiente para despertar a vontade de ver os últimos momentos do baile final daquele ano. Contra a vontade da cuidadosa Delmir, Júlio falou:

         - Mãe, se preocupe não, tá no finzin. Vou só dar uma espiadinha.

         Na entrada do clube se deparou com sua namorada agarrada a outro rapaz. A cena aguçou ainda mais a vontade de tomar um gole. Não bastasse, a orquestra tocava “oh, quarta-feira ingrata, chegou tão depressa...” O folião retardatário rumou direto para o bar e pediu:

        - Zé de Zuza, uma dose dupla pra mim.

        Após o primeiro gole seguiram muitos outros. Acabou o baile, findou o carnaval, e Júlio não retornou para casa. Raiou o dia pelos bares da cidade. Às onze da manhã, foi visto descalço e sem camisa pulando em cima do caput de uma velha rural. Naquela quarta-feira de cinzas não foi trabalhar.

        Depois de alguns anos Júlio felizmente conseguiu vencer as armadilhas do álcool. Neste Carnaval, em uma mesa de animado botequim, o bancário, com brilho nos olhos, falou para os amigos:

          - Faz dezoito festas de agosto* que eu não bebo.




* período festivo do mês de agosto em homenagem ao padroeiro de Várzea Alegre, São Raimundo Nonato.



Colaboração: Júlio Bastos

domingo, 14 de fevereiro de 2010

119 - PERDENDO O AMIGO





            A sabedoria popular ensina que ao emprestar dinheiro a um amigo o prejuízo torna-se praticamente inevitável. Como na maioria das vezes não há como negar, perde-se em dobro: o dinheiro e o amigo.

            Em Várzea alegre, no interior cearense, o saudoso Francisco das Chagas Bezerra, com seu bom senso e bom humor, sempre contornava com esperteza esses delicados momentos. Certo dia, Chico Piau, como popularmente conhecido, estava em sua casa quando foi procurado por um velho amigo com uma solicitação de empréstimo:

           - Me arrume cinqüenta reais, Chico. É só por um dia, amanhã eu pago a você.

           Chico Piau, com sua invejável capacidade de reação, respondeu de imediato:

           - Hômi, seno assim passe por aqui amanhã.



Colaboração: Jonas Moraes

(imagem) Google)

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

118 - DIETA PERFEITA






             Os conceitos giram e mudam junto com o planeta. E em matéria alimentar essas mudanças acontecem ainda mais constantemente. Uma comida ou bebida deixa de ser ou se transforma em vilã de uma hora para outra. Um dos exemplos observa-se no velho ditado “sai de mim abacaxi que eu tomei leite”, sentença popular desmoralizada nos últimos anos. Hoje o suco da fruta tropical fica ainda mais saboroso e saudável quando misturado ao leite.

         No final da década de setenta, Sérgio Pinto de Carvalho, conhecido comerciante de Várzea Alegre, foi se consultar com um famoso médico em Fortaleza. Como os exames reveleram pressão arterial um pouco elevada, o experiente profissional receitou alguns medicamentos. Preocupado, o paciente perguntou:

         - Dotô até quando eu vou precisar tomar esses remédios da pressão?

          - Tome até a missa de sétimo dia. – respondeu o médico.

           - E a dieta, dotô?, O que é que eu posso comer?

           - Coma tudo. E o que ofender você não coma mais.


(imagem Google)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

117 - BARBEARIA






           Os estabelecimentos modernos, independente do ramo principal de atividade, oferecem aos clientes diversos produtos e serviços. Em um só lugar o consumidor encontra vários itens. Hoje, os supermercados comercializam pneus, as farmácias negociam chinelos, e os postos de combustíveis oferecem tudo, até gasolina.
 
          Por muitos anos, na cidade cearense de Várzea Alegre, a barbearia do espirituoso Vicente Cesário, estabelecida na antiga Rua Major Joaquim Alves, já oferecia vários serviços e produtos. No mesmo ponto comercial, além de cortar cabelo e fazer a barba, o cliente também tinha à sua disposição uma alfaiataria, cerveja gelada e o uso do banheiro.
 
         Certo dia, um represente comercial visitava alguns clientes da pequena cidade quando sentiu uma forte cólica intestinal. Suando frio, indagou onde havia uma privada disponível. Todos indicaram a barbearia de Vicente Cesário. Ali, o uso do precário sanitário, instalado em um piso inferior, possuía preço tabelado pelo conhecido proprietário do lugar. O banho custava dois cruzeiros; defecar, um cruzeiro; e, urinar, cinqüenta centavos.
 
         O visitante, por uma escada de madeira, desceu até o escuro subterrâneo da barbearia e, sob o olhar de alguns cururus nos cantos do úmido cômodo, aliviou-se na pouca higiênica retrete. Ao subir, o usuário se dirigiu ao dono da barbearia e foi logo pagando:

        - Senhor, tome aí um cruzeiro.
 
        - Conversa é essa. Me passe mais cinqüenta centavo. Você já viu um sujeito cagar sem mijar? – retrucou o barbeiro

 
(imagem Google)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

116 - O SACO DE MANGA





              Salomão, personagem bíblico anterior a Cristo, reinou sobre Israel durante cerca de quarenta anos. Ganhou notoriedade pela sua riqueza, reinado sem guerras e, especialmente, pela grande sabedoria. Sua famosa e iluminada decisão na disputa por um bebê entre duas mulheres que se intitulavam mãe da criança encontra registro na Bíblia, no livro de Reis, capítulo 3, versículos 16 a 28.

                O exemplo de paz e sabedoria salomônica espalhou-se pelo mundo. Em Várzea Alegre, pequena cidade do sertão cearense, no final da década de setenta, o comerciante José Gonçalves, conhecido como Zé Manga Mucha, recebeu de um freguês o presente de um saco de manga jasmim. Imediatamente, Zé chamou seu filho Josimar, conhecido por Mazin, e disse:

                  - Vá deixar esse saco de manga em casa.

                  Josimar retrucou, resmungando:

                 - É danado, por que pai não manda Jossian, que é mais velho?

                  Ao ser citado, Jossian logo se recusou a carregar o saco.

                - Pai, mande Josibel, pois eu tou ocupado.

               - ôxi, Mazin e Jossian não quis levar. Eu também não vou não. – disse Josibel.

              Como os três filhos se recusaram carregar o presente até sua casa, localizada bem próxima da bodega, o comerciante Zé Manga Mucha levantou a voz com rispidez e determinou ao filho Josimar:

             - Mazin, vá agora mesmo levar esse saco de manga em casa. Não quero conversa.

           Josimar dessa vez não argumentou. Sob o olhar severo do pai e percebendo o sorriso irônico dos irmãos, apanhou o saco e saiu em direção à sua casa. Quando o carregador retornou, o comerciante se dirigiu a Jossian e ordenou:

           - Vá agora lá em casa e traga o saco de Manga.

          Os filhos entranharam a determinação. Só se o pai não quisesse mais saborear a deliciosa fruta tropical. Porém quando o saco de manga voltou a bodega trazido por Jossian, seu Zé determinou a Josibel:

        - Agora você vá levar de novo o saco de manga lá em casa.




Colaboração: Josimar Caldas Bezerra, Mazin

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

115 - FÃ NUMERO UM


         



          Airton Senna emocionou torcedores do Brasil e do resto do mundo. O fantástico piloto conseguiu transformar a elitizada Fórmula Um em esporte de massa no país. É certo que as vitórias brasileiras começaram com Emerson Fittipaldi e Nelson Piquet, mas a relação com o público tornou-se mais forte com o carismático Senna.

         Surgiram milhões de torcedores em todo Brasil. Até em Várzea Alegre a primeira categoria do automobilismo ganhou inúmeros fãs. Mas certamente nenhuma pessoa no mundo admirou tanto Airton Senna quanto o cabo reformado José Saraiva da Cruz. Não perdia a transmissão de nenhuma das corridas do ano, nem mesmo as acontecidas nos autódromos da Ásia oriental, cujo sinal chegava ao Brasil na madrugada.

         No fim da década de oitenta, em uma manhã de domingo da pacata Várzea Alegre, o cabo Saraiva se preparava para assistir a mais uma corrida do grande campeão quando ouviu um estrondoso trovão. O sinal da TV desapareceu. Bateu um desespero no torcedor, pois o horário da largada se aproximava e a televisão só chiava. Imediatamente resolveu ligar para o seu filho, Sargento Klécio Dawinson, que fazia um curso no Rio de Janeiro.

           Logo Saraiva e o seu filho descobriram uma maneira rápida de sanar a falta do sinal de TV em Várzea Alegre. Na Cidade Maravilhosa Klecin pôs o telefone na caixa de som da televisão para seu querido pai escutar em Várzea Alegre toda a narração da corrida.

           O torcedor ouviu tudo, inclusive as propagandas e os comentários do expert Reginaldo Leme. Só desligou o telefone depois que ouviu o famoso tema da vitória e a ansiada frase do narrador Galvão Bueno:

           - Airton Senna do Brasillllllllllllllllll...


Colaboração: Klébia Fiúza