Lembro
que, na década de setenta, em Várzea Alegre, sertão cearense, meu querido pai,
Luiz Cavalcante, após um dia de intenso trabalho na bodega, ao chegar em casa sempre
pedia a um de nós:
-
Meu fii, pegue minha chinela japonesa*...
O
simples e confortável calçado era o prêmio que seus pés recebiam depois de
várias horas de trabalho duro, afinal, em sua longa jornada, o bodegueiro não
sentava um só momento.
Hoje
vejo que a velha e modesta chinela deixou o canto escuro do banheiro onde era
guardada lá em casa e passou a frequentar lugares refinados como shoopings, boites e restaurantes. Meu velho pai continua na sua bodega em
Várzea Alegre, foram as chinelas Havaianas,
com enorme sucesso e incrível ascensão social, que ganharam o mundo.
Meses
atrás visitava meu tio José Cavalcante Cassundé, Zé do Norte, em sua sortida sapataria de Várzea Alegre, quando me espantei
com o pedido de um cliente:
-
Seu Zé do Norte, minha zapragata* currulepo arrancou o biloto,
aqui vende as correa?
Maior
espanto eu senti quando, em tempos de sucesso das alpargatas Havaianas,
meu tio, comerciante há décadas, confirmou a oferta avulsa das tiras. Falando
alto, como de hábito, se dirigiu a uma das suas vendedoras:
- Ei minha fia, pegue aí uma correa
de japonesa. E só um real o par...
* corruptela de alpargata, tipo de calçado usado pelos cangaceiros, muito usada no Nordeste. Também conhecida por alpercata, passou a nominar as atuais chinelas de dedo.
* as chinelas japonesas eram
sandálias de
borracha usadas pelas classes econômicas mais baixas, principalmente para
serviços domésticos e trabalho na construção civil.
(imagem Google)
Nenhum comentário:
Postar um comentário