terça-feira, 31 de março de 2009

24 - CHICO NENEN

Sou o pior contador de histórias e o menos espirituoso da família. Por isso decidi apenas registrar passagens que escuto. Assim, me escondo por trás das palavras. Já meus tios maternos sempre possuíram uma apurada veia para o humor. Como bons cearenses, nunca escolheram ocasião para fazer graça nem lugar para descontrair o ambiente.



Certo dia, após a perda de um ente querido, minha avó Maria Amélia, com sua fortaleza interior, reuniu os familiares em sua casa para oração a Deus e palavras de conforto. Com sabedoria, lembrou do caráter passageiro da vida terrena, ressaltando que após a morte temos a certeza da paz eterna.



Meu tio Francisco da Chagas, o Chico Neném, encostado em um canto da sala, ouviu atentamente as sábias e confortadoras palavras. Mas, na saída, ainda abalado, tirou o polegar direito da boca e, com sua voz grave, retrucou:



- Mãe, me perdoe, eu não sei se tem paz eterna depois da morte, mas pá e terra eu garanto que tem.



Colaboração: Rosa Amélia Costa Macedo

segunda-feira, 30 de março de 2009

23 - DISPENSA VAZIA



O meu olhar mais distante para o passado já alcança Antonia Alves Bezerra, Tonha, morando na casa de meus tios Sérgio e Rosa Amélia. Por várias décadas, com completa dedicação e carinho, Tonha contribuiu para a boa criação dos filhos do casal.



Mulher simples, não frequentou escola nem se interessou por ampliar seus conhecimentos. Sua vida se restringiu apenas a cuidar das seis filhas e do único filho varão dos meus tios.



Certo dia, tia Rosa Amélia saiu e deixou as quatro primeiras filhas - Romélia, Rosélia, Rosânia e Rosiana - aos cuidados da recém chegada Tonha. Ainda desacostumada com a rotina da casa, a nova babá perguntou à patroa se era pra dar comida para as crianças, recebendo uma resposta um pouco ríspida:



- Tonha, é lógico que tem que dar, lógico que tem.



Ao voltar para casa, poucas horas depois, tia Rosa Amélia encontrou as filhas irritadas, principalmente a bebê Rosiana, conhecida por sua gulodice, que chorava compulsivamente. A mãe, logo percebendo tratar-se de fome, buscou saber o motivo pelo qual a babá não dera o mingau às crianças. Tonha, com seu jeito rude de falar, foi logo dizendo:



- Diacho, eu cacei na dispensa e num achei “lógico” pra mode fazer o mingau das meninas.



Colaboração: professora Rosânia de Carvalho Costa
(imagem Google)

domingo, 29 de março de 2009

22 - MUNDIN E O IRMÃO

Mundin do Sapo, citado na postagem a eloqüência do Matuto, era capaz de saídas bem humoradas em qualquer situação. Nem mesmo o momento delicado de uma doença na família era capaz de bloquear sua inspiração.

Na década de setenta, seu irmão João Alves de Meneses, respeitado pecuarista e agricultor, foi abatido por uma grave doença. Ardendo em febre, João do Sapo, como era conhecido, embora acamado passou a se comportar como se tangesse uma grande boiada. Na sua imaginação, atravessava os animais pela águas do Riacho do Machado, córrego intermitente que corta grande área de terras férteis em Várzea Alegre. A alucinação da febre trouxe à mente do enfermo sua lida diária com o gado.

Mundin, que prestava assistência ao lado da cama, vendo seu querido irmão suar em calafrios e sofrer com ininterruptas dores de barriga, não deixou passar em branco, desconcertando todos os presentes:

- Meu irmão, aproveite, alivie a barriga da desinteria e tome um bom banho na passagem pela cheia do Machado.



Colaboração: Francisca Meneses Costa, dona Franci.

sábado, 28 de março de 2009

21 - O AQUECIMENTO DE CATITIA



Os nascidos antes de 1970 lembram bem de um varzealegrense de apelido Catita, incansável chapiado* e atleta nas horas vagas. Não há como esquecer suas participações nas provas de pedestrianismo na semana do município no mês de outubro. Catita todo ano ganhava a corrida, e com grande folga. A série de vitórias sofreu interrupção apenas com a chegada em Várzea Alegre dos bem treinados militares do Terceiro Batalhão de Engenharia e Construção, unidade do exército responsável pelas obras locais da BR 210 – Transamazônica.

Certa manhã, ainda bem cedo, o popular médico Iran Costa merendava tapioca com amendoim na padaria do seu Zequinha na vizinha cidade de Farias Brito, distante cerca de trinta e cinco quilômetros de Várzea Alegre, quando avistou o conterrâneo Catita passar correndo e o chamou:

- Catita, para onde você vai com tanta pressa?

- Dotô, vou pr'uma corrida hoje no Crato, me dê um trocado pra mode comprar fumo.

O médico atendeu ao pedido e o diferenciado atleta seguiu sem descanso para o restante da viagem, cerca de cinqüenta quilômetros, mascando fumo e trotando em direção à Capital Cultural do Ceará.

Não há notícia se Catita venceu a prova naquele dia, mas com certeza chegou bem aquecido e ainda dopado com o tabaco que mascou no acidentado percurso até a agradável cidade do Crato.


* trabalhador braçal responsável pela carga e descarga de caminhões.

Colaboração: Terezinha Costa Cavalcante

sexta-feira, 27 de março de 2009

20 - ELOQUÊNCIA DO MATUTO

A antiga arte de se comunicar, embora amplamente ensinada nos livros, não se aprende apenas nos bancos de escola. Diariamente encontramos pessoas simples e sem estudo formal desenvolvendo verdadeiro dom para a comunicação.

Raimundo Alves de Menezes, conhecido em Várzea Alegre como Mundin do Sapo, foi uma dessas pessoas que impressionaram com a capacidade de transmitir seu recado usando a linguagem simples do matuto. Homem da roça, conversador, caricato e de gestual forte, tornou-se conhecido por sua fala descontraída e desinibida, sempre capaz de tiradas inteligentes e bem humoradas.

Certa ocasião, no meio da rua, em dia movimentado de feira, um conterrâneo metido a culto, no interesse de impressionar, interrompeu uma conversa travada entre amigos, abordando Mundin com frase repleta de palavras difíceis.

Mundin, agoniado com a inconveniente situação, não entendendo patavina do que escutava, sem meias palavras, com voz pausada, logo advertiu o amigo:

- Homi, venha com um português rasteiro que nois num tamo sabeno o que tá falano.

O recado surtiu efeito imediato e calou o incompreensível erudito, permitindo que Mundin continuasse a conversa com seu eloquente português de matuto.

quarta-feira, 25 de março de 2009

19 - PAIXÃO ANIMAL



O difícil trabalho de investigação requer uma atitude de desconfiança permanente. Mesmo com as modernas técnicas, ainda hoje os policiais enfrentam enorme dificuldade na elucidação dos crimes, especialmente os sexuais, cometidos na clandestinidade.



Meu avô materno, Antônio Alves Costa, na década de cinqüenta, foi delegado de polícia no interior do Ceará. Naquele período, pela completa falta de estrutura, o importante cargo exigia do seu ocupante um grau ainda maior de perspicácia na apuração dos delitos.



Em certa manhã, o Delegado Antônio Costa foi acionado para atender um desesperado cidadão que desejava “dar parte” do rapto de sua filha de vinte anos de idade. Imediatamente intimado a comparecer na Delegacia, o suspeito confessou que “roubara” a moça. Porém, temendo as conseqüências, principalmente a obrigação de casar, buscou diminuir sua responsabilidade. Assim, mesmo admitindo que fizeram uma longa viagem juntos, o rapaz insistiu que não havia “bolinado” a jovem.



A frágil versão apresentada só aumentou a desconfiança do Delegado, que, com seu alto e rouco tom de voz, argumentou:



- Meu rapaz, não queira que eu acredite nessa história. Pois quando solteiro, eu fui para um samba num local bem mais perto. Do sítio Umari até o Junco*. E só na ida eu namorei com a minha burra Gasolina duas vezes.




* atual município de Granjeiro

segunda-feira, 23 de março de 2009

18 - SELADO

Pedra de Clarianã mal completou um mês e já recebeu mais de mil visitas. Claro que o responsável por umas novecentas fui eu conferindo o número de acessos.

Ontem, não consigo esconder, fiquei todo todo, na maior pavulagem. Pois Alcinéa Cavalcante - poeta, jornalista e excelente contadora de histórias - nos carimbou com um selo.

sábado, 21 de março de 2009

17 - CABO SERGIN



Nesta última década os meios de comunicação apresentaram progressivo avanço. Hoje contamos com modernas formas de contatos como aparelhos celulares, internet, ipods, iPhones e outros.



Nem parece que há poucos anos tudo era bem diferente.



No final da década de setenta, por ainda não funcionar a discagem direta, as ligações telefônicas entre muitas cidades eram intermediadas por telefonistas. Para conseguir uma chamada necessariamente entrávamos em uma fila, até que a funcionária da companhia telefônica completasse a ligação.



Meu querido tio e professor Paulo Danúbio, aproveitando o auge do militarismo, sempre que buscava uma ligação, com voz postada, dizia para a telefonista:



- Por favor, aqui é o Coronel Paulo Danúbio, gostaria de uma ligação para Várzea Alegre.



Assim, com urgência, a telefonista completava a ligação para o fictício Coronel.



Meu saudoso primo Sergin, observador, ainda pré-adolescente, certo dia, em contato com a nem sempre atenciosa telefonista, resolveu copiar a estratégia:



- Olha, aqui é o Cabo Sérgio Ricardo, exijo imediatamente uma ligação para Várzea Alegre.



Não sei se por conta do congestionamento das ligações ou por falta de força da patente, mas infelizmente a ligação do meu primo demorou várias horas para ser completada.




quinta-feira, 19 de março de 2009

16 - MOTORISTA DA VIDA



Dirigir um automóvel sempre foi algo que provocou muito receio, desde a época dos antigos chauffers, quando, além dos conhecimentos de mecânica, necessitavam de força para girar a manivela e virar o motor do veículo.



No início da década de setenta, minha tia Rosamélia manifestou ao marido o desejo de aprender a dirigir. Muito prendada e habilidosa, todos acreditavam que depois de poucas aulas teóricas e práticas ela logo estaria pelas ruas da pequena cidade dirigindo um Jeep ou uma Rural da Willys, carros comuns à época.



Assim, em uma estrada pouco movimentada, minha tia foi receber as primeiras instruções práticas e se acostumar com o volante. Após a primeira saída, com o veículo em movimento, o instrutor, ao lado, disse para a aprendiz de motorista:



- Tá vendo aquela moita na beira da estrada? Faça de conta que é uma pessoa pedindo carona. Pare ao lado para apanhar o passageiro.



A aluna buscou fazer o que o instrutor pediu. Porém, em vez de parar ao lado, passou por cima do arbusto, só freando bruscamente metros depois de atropelar a pequena planta.



Com o fatídico episódio, perdemos uma motorista, pois titia desistiu completamente de conduzir veículos, passando apenas a bem guiar nossas vidas.

domingo, 15 de março de 2009

15 - BIG BEN CEARENSE



Meu avô paterno nasceu Raimundo Cavalcante, mas logo se tornou conhecido como Raimundo Silvino, em referência ao seu pai. Trabalhador, comunicativo, marcou fortemente sua história, deixando exemplos de iniciativa, coragem e honestidade. Até hoje, vários descendentes continuam exercendo atividades comerciais iniciadas pelo filho do Mestre Silvino.

Outras facetas marcantes na vida do meu querido avô também são sempre lembradas. Uma delas era seu lado britânico. Mesmo não vindo da Terra da Rainha, exagerava um pouquin no cumprimento dos horários.

Meu avô viajou várias vezes ao Cariri para adquirir mercadorias e abastecer seu comércio em Várzea Alegre. Saía tão cedo para superar os cerca de cem quilômetros da viagem que, ao chegar em Juazeiro do Norte, por algumas horas, aguardava o comércio da terra de Padre Cícero abrir suas portas.

Outro dia, ainda na escuridão da madrugada, meu avô foi até a Casa São Raimundo, de sua propriedade, e encontrou o comércio fechado. O responsável pela abertura da bodega era seu primogênito. No local, meu avô, visivelmente aborrecido, comentou com o proprietário do estabelecimento vizinho, José Primo de Moraes:

- Zé Bilé, o expresso Crateús já chegou com os passageiros do Juazeiro e Luiz, que mora aqui pertin, ainda não apareceu para abrir a Bodega.

 
Colaboração: Luiz Fernando Costa Cavalcante
(imagem Google)

sábado, 14 de março de 2009

14 - O BENFEITOR



A devoção pelo padre Cícero Romão Batista no interior do nordeste brasileiro cresce a cada dia. Todo ano, centenas de milhares de romeiros peregrinam até Juazeiro do Norte, progressista cidade cearense onde o padre construiu sua história.



Certo dia, uma romeira, sem teto, vinda do Juazeiro do Norte, instalou-se com sua pequena mudança embaixo de uma ponte na entrada de Várzea Alegre. Chico Piau soube da precária situação e ofereceu uma casa para a pobre mulher. Não exigiu pagamento, apenas o compromisso do aluguel quando a condição financeira da inquilina melhorasse.



Sensibilizado, o próprio Chico providenciou a mudança. Porém, logo no dia seguinte, a romeira procurou o benfeitor e exigiu:



- Precisa providenciar a luz da casa. Quando melhorar eu também pago a energia. É que meu padre Cícero não dorme no escuro.



Chico Piau, desconfiando que a romeira já explorava sua bondade, imediatamente respondeu:



- Minha senhora, é fácil resolver esse problema, é só colocar seu Padre Cícero para dormir durante o dia.



Colaboração: Daniel Rocha
(imagem Goggle)

sexta-feira, 13 de março de 2009

13 - DILÚVIO



Era um final de tarde comum. Zé, trabalhador rural, acabava de chegar em casa. Andava meio revoltado com os amigos, com os vizinhos, com a própria vida, mas não conseguia identificar a razão de tamanho descontentamento. Em um repente, dirigiu-se à janela, observou o céu nublado, e vociferou:

- Tomara que caia uma chuva maior que a do dilúvio e afogue todos os cornos de Várzea Alegre.

Sua mulher, sentada próximo, de cabeça baixa, com voz pausada, alertou:

- Zé, deixa disso, tu não sabe nadar...

Com ar de desentendido, o trabalhador dirigiu o olhar novamente para o céu e nada mais falou. Nem mesmo manifestou o interesse em receber aulas de natação.

Colaboração: Maria do Socorro Costa Bezerra
(imagem Google)

domingo, 8 de março de 2009

12 - RÁDIO SEM DEFEITO



Além do canário citado em postagem anterior, Chico Piau negociou com vários outros animais e objetos. O imaginável e o não imaginável, em especial coisas antigas, Chico possuía para vender.

Há cerca de trinta anos, logo que inaugurou a Rádio Cultura de Várzea Alegre, um antigo morador do sítio Carrapateira procurou Chico Piau para comprar um aparelho de rádio. O vendedor logo apresentou seu produto:

- Eu tenho um motorádio dos bons, pega até a Hora do Brasil, tá todo mundo querendo comprar, mas parece que tava esperando você.

Dias depois do negócio concretizado, o comprador procurou Chico, reclamando:

- Eu vim devolver o rádio caro que você me vendeu. Não funciona direito. Pois pega a rádio Salgado de Lavras, a Montevidéu do Cedro, a Educadora do Crato, só não pega a rádio Cultura aqui de Várzea Alegre.

Chico não gaguejou e foi logo justificando:

- Isso que dá negociar com gente sem conhecimento. Rapaz, quando esse motorádio foi fabricado não existia ainda a Rádio Cultura, por isso não pega.

Com a resposta, o comprador coçou a cabeça e saiu sem dizer nada, levando de volta o velho aparelho comprado de Chico Piau.


Colaboração: Antônio Alves da Costa Neto
(imagem Google)

sábado, 7 de março de 2009

11 - A RESPOSTA DA SANFONA



Recentemente Várzea Alegre sofreu com a perda de um popular artista. Chico de Amadeu, que com sua sanfona animou bailes e marcou alegremente a vida de várias gerações, aceitou convite para tocar no céu. Além do incontestável talento musical, o sanfoneiro apresentou ao longo da sua vida um ótimo senso de humor.



Companhia agradável, Chico de Amadeu cultivou várias amizades, uma delas com o primo e comerciante Alberto Siebra, proprietário da cinquentenária Casa Zé Augusto. Em um encontro de amigos no bem freqüentado bar de Alberto, Chico consumiu várias cervejas e na saída mandou anotar no caderno de fiados.



Passado algum tempo, Chico de Amadeu caminhava com outros amigos pelo calçadão Antônio Costa, quando Alberto, com sua ‘discrição’ característica, de longe, do seu estabelecimento, gritou:



- Chico, o que eu faço com as cervejas????



No que o sanfoneiro respondeu:



- Alberto, meu primo, pode colocar no congelador que mais tarde eu passo pra gente beber...

 
Colaboração: Antônio Alves da Costa Neto
(imagem Google)

sexta-feira, 6 de março de 2009

10 - DEFEITO NO JIPE



O jeep fabricado pela willys se notabilizou na última metade do século passado pela resistência e durabilidade. O automóvel dificilmente apresentava problemas na sua mecânica ou lataria. Tamanho foi o sucesso do carro que até hoje é admirado, cultuado e usado em clubes do Jeep espalhados pelo mundo inteiro.

Mas todo caso tem exceção.

Certo dia, em Várzea Alegre, o conhecido barbeiro Vicente Cesário e outros amigos alugaram um Jeep para comparecer em um velório na Varzinha, sítio próximo à sede do município. Após prestar as homenagens ao falecido, quando já voltavam para a cidade, o barbeiro Vicente Cesário sugeriu para o chofer e proprietário do carro:

- Não dá pra esse jipe fazer uma dobra lá pelo cabaré não?

O motorista do veículo logo respondeu:

- Vicente, esse carro não anda em cabaré não.

O barbeiro, outro varzealegrense espirituoso, retrucou imediatamente:

- Vixe Maria, se eu tivesse um jipe com um defeito tão grande eu passaria logo pra frente.


Colaboração: Antônio Alves da Costa Neto
(imagem Google)

quinta-feira, 5 de março de 2009

9 - VIAGRA DO SERTÃO



As moagens do engenho de cana-de-açúcar de seu Nonato Rolim, no sítio Medeiro em Várzea Alegre, demandavam um trabalho intenso e duravam alguns meses. Vários trabalhadores se ocupavam na árdua produção da rapadura. Além do corte da cana, realizavam outras inúmeras atividades, como cuidar da fornalha e manejar tachos e gamelas. Alguns operários eram contratados na sede do município e passavam um período inteiro no trabalho, retornando à cidade, em rápida visita à família, apenas de quinze em quinze dias.



Borboleta foi um desses trabalhadores que produziram rapadura no Medeiro por algum tempo. Contava que, na pequena folga, ao chegar em casa, trazia o corpo quente como a fornalha do engenho, por conta dos vários dias longe da mulher e também em razão das revigorantes garapas de cana e rapas de gamela consumidas intensamente. Fácil imaginar a energia acumulada, pois são famosos os efeitos fortificantes da rapadura, hoje conhecida como o Viagra do Sertão .



Mas aquele humilde trabalhador, com vários filhos pequenos, residia em uma casa modesta, sem divisão em cômodos, carente de qualquer privacidade. Dessa forma, era enorme a dificuldade para matar a saudade da esposa.



Borboleta, então, não enxergava outra maneira que permitisse o seu contato íntimo com a mulher. Para conseguir os prazerosos momentos de privacidade amarrava os filhos pequenos no quintal da casa.



Ouvindo essa história caímos na tentação de censurar a conduta extrema daquele rude trabalhador. Porém, atire a primeira pedra aquele que, em momentos semelhantes, não pensou em amarrar os filhos pequenos, como necessitou o desesperado Borboleta.
(imagem Google)

terça-feira, 3 de março de 2009

8 - PASSARINHO CANTADOR



A criação em cativeiro de pequenos pássaros sempre foi comum no Brasil, notadamente nas pequenas cidades do interior. E em que pese a proibição da comercialização dos animais, o costume infelizmente ainda persiste.

Há anos, Francisco das Chagas Bezerra, o popular Chico Piau, anunciou um canário à venda dizendo que se tratava de um passarinho muito bom. Com a propaganda do animal logo apareceram vários compradores. Chico Piau, negociante nato, aproveitou a boa procura e vendeu seu passarinho por um ótimo preço.

Passadas algumas semanas, o comprador encontrou Chico Piau pela rua e reclamou:

- Chico, você me enganou, esse canário que me vendeu não canta nada, vive triste e calado na gaiola.

Chico Piau, espirituoso como poucos, respondeu de imediato:

- Enganei nada, rapaz. Esse canário não canta, mas é ótimo compositor.

 
Colaboração: Luiz Fernando Costa Cavalcante
(imagem Google)

segunda-feira, 2 de março de 2009

7 - SABEDORIA DE MÃE





Adélia Pimpim, conhecida carinhosamente como “Dedé”, recebia total atenção e nutria grande afeição por seus filhos, principalmente por seu primogênito, único varão, o bem conceituado comerciante Sérgio Pinto de Carvalho.

No entanto, mesmo os mais dedicados filhos vez ou outra aborrecem a mãe. Certo dia, Dedé, já octogenária, teve uma raiva do seu caçula. Mas não era mulher de guardar sentimento ruim dentro de si. Assim, colocou seu vestido de sair e foi ao movimentado comércio do seu filho. Lá chegando, encontrou somente Sérgio e uns poucos funcionários do armazém. Da porta, Dedé, de pequena estatura, com dedo em riste, foi logo esbravejando:

- Sérgio eu vim aqui para dizer umas poucas e boas a você, mas como não tem quase ninguém eu volto quando o armazém tiver cheio.

Por vários dias, a todo instante, sobretudo quando o comércio lotava de fregueses, Sérgio suava frio e olhava desconfiado para a porta do seu armazém.

Dedé não voltou, porém seu recado foi bem dado.

Há valorosos ensinamentos em obras de educadores como o renomado Içami Tiba, mas certas situações da vida exigem atitudes com a inspiração e a sabedoria da saudosa Dedé.



(imagem Google)

domingo, 1 de março de 2009

6 - BANHOS DE CARNAVAL



Depois de conquistar o título em 2008 homenageando os 250 anos de Macapá, semana passada a escola de samba Beija-Flor de Nilópolis desfilou na Marquês de Sapucaí apresentando outro interessante enredo: no chuveiro da alegria, quem banha o corpo lava a alma na folia. Representada em belas alegorias, a escola mostrou na avenida que o hábito de se banhar remonta os tempos dos antigos egípcios.

É bem verdade que, como cantado por Neguinho da Beija-Flor, a forma e a regularidade do banho diferem em cada cultura, em cada costume, em cada pessoa.

Conta a lenda que um conhecido conterrâneo só se “asseava” uma vez por semana, sempre às sextas-feiras. Certo dia, no meio do banho, já esfregando as dobras do corpo, referido senhor perguntou à esposa:

- Muiê, que dia é hoje mermo ???

- Quinta–feira, homi. - respondeu a esposa.

- Arriégua, você nem me avisa antes. Perdi as contas e estraguei um banho.