domingo, 31 de julho de 2016

930 - DA "MADAREIA" AO 'QUINCUNCÁ"

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Segundo trabalho científico apresentado no V Encontro Nordestino de Biogeografia por Antônia Eliene Duarte e outros especialistas, havia, no alto da serra, um descampado arenoso onde o gado costumava malhar, que, ao longo do tempo, de malhada da areia se transformou na corruptela “madareia”. Por sua vez, no consagrado livro “Os Sertões”, o escritor fluminense Euclides da Cunha cita quincuncá como vocábulo de origem tapuia, grupo indígena que habitava o interior brasileiro, usado para designar acidente geográfico.



Pois no último dia de julho, realizando desejo de nosso pai Luiz Cavalcante, saímos em busca de conhecer essas duas localidades serranas. Madareia, situada no limite dos Municípios de Várzea Alegre e Cariús, e, Quincuncá, no vizinho município de Farias Brito.



Sentindo os fortes ventos e a amena temperatura do local, da bela vista do alto da Serra da Madareia observamos grande parte de Várzea Alegre, mas outras elevações geográficas encobriam a sede do município. Poucos moradores da pequena localidade se arriscaram a abrir portas ou janelas das suas modestas casas, certamente estranhando os inesperados visitantes ou temendo o vento frio da manhã de domingo.



Saindo da Serra da Madareia, seguimos imediatamente em direção à Farias Brito para também conhecer a do Quincuncá. Ali, a íngreme subida foi facilitada pela recente pavimentação da sinuosa estrada que dá acesso às localidade  serranas.



Bem no alto, paramos para conhecer o Pontal do Padre Cícero,  mirante com belíssima vista para o Município de Farias Brito. Reza a lenda que o local foi indicado pelo venerado Padre de Juazeiro como um dos poucos pontos da região para se escapar de uma temida enchente causada por águas das fontes do Cariri, caso houvesse o deslocamento da famosa Pedra da Batateira, no Crato.



Por fim, no alto da serra, após passar pela comunidade do Umari, finalmente chegamos à progressista  Quincuncá, antiga Araticum, onde visitamos a capela de São José e nos encontramos com simpáticos moradores do distrito.  Na conversa, indagamos sobre a origem do nome Quincuncá, ouvindo várias versões.



Porém, de todas, a melhor justificativa para o nome da serra de Farias Brito, escutei há alguns anos da prima Wellen Liberalino. Segundo ela, há muito tempo na localidade dos seus avôs paternos havia apenas uma pessoa que sabia ler e escrever, responsável por redigir as cartas postadas pelos moradores da antiga localidade de Araticum. Quando perguntavam o seu nome, dando origem à denominação do local, ele respondia: “Sou Kinco, Kinco Com K”.

(imagem Google)

sábado, 30 de julho de 2016

929 - RAPADURA

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Hoje, no sitio Macacos, distrito de Mangabeira, Município de Lavras da Mangabeira, visitamos um dos últimos engenhos de rapadura em funcionamento na região centro-sul do Ceará.  Segundo o proprietário, senhor Gabriel Holanda Nunes, conhecido como Bié, de 79 anos, a “moagem” funciona desde à época do seu avô, quando ainda movida pela força animal, por juntas de boi. Dos 36 engenhos que funcionavam em Mangabeira, apenas o do sítio Macacos continua ativo, produzindo a tradicional e deliciosa rapadura.


Em meio roças,  moendas e fornalhas, vários profissionais desempenham suas atividades na produção do saboroso tijolo, tais como os plantadores da cana, bagaceiro, caldeireiro e cacheador. Entre eles, o mestre, que, com sua experiência e prática, decide o momento exato em que o mel pode se transformar em rapadura.


Além dos conhecimentos práticos, adquiridos ao logo de séculos de observação e experiências, várias crenças e superstições envolvem o funcionamento do engenho. Uma delas consiste em parar toda a produção na primeira segunda-feira de agosto, pois esse dia é considerado de “má sorte” e pode causar um acidente ou uma pane nas máquinas.


No engenho dos Macacos, ao contrário de outras indústrias modernas, não há a adição de produtos químicos para aumentar o teor de sacarose na rapadura. Utiliza-se apenas as misturas tradicionais, como a cal, logo após a moagem da cana, que serve para limpar a garapa. No fim do processo, o mestre da rapadura também adiciona o sebo de gado, para endurecer o mel e fazer jus ao conhecido nome do produto final.


Ouvindo atentamente a explicação, meu tio Paulo Danúbio, professor aposentado, perguntou:


- Seu Bié, o sinhô vende esse balde de Sebo de Gado?

- E o senhor vai botar um engenho de cana? – indagou o simpático proprietário da moagem.

- Não, seu Biê, quero ver se esse sebo serve pra endurecer outras coisa...
(imagem Google)

terça-feira, 26 de julho de 2016

928 - II GINCANA CULTURAL E ESPORTIVA DO JUAZEIRINHO

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     Neste último final de semana, a convite de Edinaldo Rodrigues e Sandro Santos, estivemos na zona rural de Várzea Alegre,  sertão cearense, acompanhando alguns momentos da segunda edição da gincana cultural e esportiva do distrito de Juazeirinho.

      Cerca de 100 crianças e adolescentes participaram de atividades promovidas pela Associação Comunitária do Juazeirinho com o apoio do grupo de jovens do vizinho distrito de Canindezinho.

      Foi emocionante e divertido ver jovens e crianças correrem pelos ramais de terra de chão batido. Mesmo sem calçar os tênis apropriados ou até mesmo correr descalços carregando as chinelas nas mãos, meninos e meninas mostraram a força socializante e educativa do esporte.

     Lembrando as tradicionais provas da Semana do Município, ocorreu ainda corrida de jumentos, com os animais montados e guiados por pequenos, corajosos e desenvoltos garotos. Entre as diversas modalidades assistimos à acirrada competição de ciclismo, com a utilização pelos jovens atletas das velhas bicicletas usadas para se deslocar no dia a dia pelas empoeiradas estradas vicinais da região.

      Na parte final das atividades da manhã de domingo, em meio às animadas provas de trancelim e das disputas das cadeiras, fotografávamos algumas frases do mestre Paulo Freire registradas na Escola São Pedro quando o garoto especial Wesley, mesmo com dificuldade para controlar os seus movimentos, fez questão de posar junto com as palavras do consagrado educador.

     O menino Wesley fez brilhar ainda mais a mensagem pintada na parede de que “feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”. E, ainda, nos fortaleceu a convicção de que abençoada e próspera é a comunidade que permite às suas crianças e aos seus adolescentes conhecer e saborear os deliciosos ensinamentos do esporte e da cultura.

(imagem Google)

quarta-feira, 20 de julho de 2016

927 - DO RIACHO DO MACHADO AO "VELHO CHICO"

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      Navegar é preciso, navegar pelos rios brasileiros é necessário, fascinante e engrandecedor. Assim, semanas após conhecer as águas amazônicas que banham a ilha do Marajó, aproveitamos as férias pelo nordeste do país para beber um pouco da cultura, história e riqueza do Rio São Francisco.

     Saimos de Várzea Alegre, cidade do cariri cearense banhada pelo temporário Riacho do Machado.  Para chegar a Canindé do São Francisco, próximo à barragem e hidrelétrica de Xingó, nas margens do "Velho Chico", viajamos quase 600km pelos Estados do Ceará, Paraíba, Pernambuco, Bahia, Alagoas e Sergipe. No percurso, passamos por vários canteiros da grandiosa obra de transposição das águas do São Francisco para áreas distantes do semiárido nordestino.

     Pelas águas do Rio São Francisco, em um catamarã, participamos de um interessante passeio nominado Rota do Cangaço, seguindo rastros das lendárias histórias de Lampião, Maria Bonita e seu bando. No município de Poço Redondo, desembarcamos e percorremos 600 metros de tortuosa trilha até a conhecida Grota do Angico, local onde, em 28 de julho de 1938, tropas comandas pelo Tenente João Bezerra surpreendeu os cangaceiros, matando Lampião, Maria Bonita e mais 9 seguidores do polêmico “Rei do Cangaço”.

     Em parte do São Francisco, paredões sedimentares, avermelhados, conhecidos como cânions, formam um corredor, lindo cenário em contrastes com as cores azulada ou verde das águas do rio.

      Em Piranhas, cidade alagoana tombada pelo patrimônio histórico nacional, chamada Guardiã do Rio São Francisco, visitamos o museu do sertão e admiramos outros conservados prédios do centro histórico. Naquela simpática cidade, o esforço de subir centenas de degraus para conhecer os mirantes secular e da igreja do Senhor do Bonfim nos trouxe a recompensa de lindas paisagens produzidas especialmente pelo Rio São Francisco.

      Na primeira metade do século passado, favorecido pelo isolamento, Lampião escolheu aquele pedaço do Brasil próximo a divisa de vários Estados para atuação preferencial do seu bando, onde, mesmo assim, foi cercado e morto. Hoje, vencido o isolamento, o São Francisco sobreviveu a vários ataques. Produz a energia que impulsionou o desenvolvimento do nordeste e, torcemos, para que logo distribua  água para molhar as áridas e férteis terras da nossa região.  



(imagem Google)


domingo, 10 de julho de 2016

926 - VENEZA MARAJOARA



Neste fim de semana, atendendo convite do casal Ana Iria e Renato Ribeiro, navegamos por extensas baias da Foz do Amazonas, desde Macapá até Afuá, cidade ribeirinha ao norte da ilha de Marajó. Foi minha primeira vez na “Veneza Marajoara”, assim chamada porque cortada por vários rios, como Cajuuna, Marajozinho e Afuá.

Após deslumbrantes paisagens na viagem em direção ao arquipélago do Majaró, fomos muito bem recebidos em Afuá por seu Dalk Salomão, simpático morador que nos hospedou e nos acolheu com intenso carinho. Eu, minha família e amigos logo nos sentimos em casa.

Caminhando pelas pontes da cidade paraense, algumas construídas em concreto, sentimos a dimensão da vida ribeirinha. A comunidade se mistura aos rios que a banha e se completa com aquelas extensas faixas de águas da bacia amazônica.

            Na movimentada orla, em meio a intenso comércio de produtos da floresta, comprei limões cidra (ou galego). O vendedor me convenceu apresentando as inúmeras qualidades do fruto:

- Tira "pitiú" de peixe e afasta "panema".

            Mesmo me achando cheiroso e me considerando sortudo, resolvi comprar os limões. Afinal nunca é demais cuidar da higiene corporal e sempre é bom reforçar as proteções contra o azar.

            Se na Veneza italiana as gôndolas singram os canais e compõe sua paisagem; na Marajoara, a bicicleta representa o único meio de transporte permitido sobre as pontes. Os serviços de táxi, primeiros socorros, segurança pública, combate a incêndio, transporte pessoal, tudo é desempenhado com o apoio do saudável veículo.

            No período de "agua grande", por volta do mês de março, a maré sobe muito e avança por baixo dos imóveis edificados sobre palafitas. Nesse período, o cemitério da cidade também permanece coberto d'água, razão pela qual os próprios moradores de Afuá brincam que ali o morto morre várias vezes, já que, mesmo enterrado, morre afogado todo ano na água grande.
 
            Os três dias que passamos pela cidade nos deixaram uma ótima impressão, tanto que, na volta para Macapá, na rápida lancha a motor Virgem da Conceição VI, quando ainda atravessávamos a chamada Baía do Vieira, deu saudade da sossegada, agradável e simpática Afuá.

(imagem Google)