sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

976 - O MACHADO E O AMAZONAS



            Moro há 27 anos em Macapá, às margens do Amazonas, maior rio do mundo em volume d’água. Mas nasci no centro-sul cearense, em Várzea Alegre, onde o pequeno e intermitente Riacho do Machado representa para o sertanejo local o que o Amazonas significa para a povo da região Norte do Brasil.

            Citado no Hino de Várzea Alegre, na letra do compositor Zé Clementino, as águas do município cearense deslizam mansas no Riacho do Machado. E em férias pelo Ceará, no início de 2018, aproveitei para, com um pequeno grupo de parentes e amigos, melhor conhecer esse córrego tão importante para a agropecuária e para o abastecimento de nossa cidade.

            Estivemos no sitio Mameluco, distrito do Riacho Verde, onde, da encosta da serra do Rubão, duas grotas se unem pra formar o nosso Riacho. Deixou-nos preocupado o baixo volume do Açude Olho D’Água, o seu principal reservatório. Dele sai a água que abastece a sede do município.

            Caminhamos em outros locais por onde o temporário Machado percorre, formando um imenso vale, chamado popularmente de “ribeira”. Compondo a microbacia do Rio Salgado, o riacho molha também terras de municípios vizinhos, até sua desembocadura no Sitio Juazeirin, em Lavras da Mangabeira. Ali conhecemos onde suas águas se juntam ao Salgado e depois seguem em direção ao Jaguaribe, principal rio do Ceará.

            Só quem vive no semiárido nordestino entende porque o encantamento e respeito por um riacho temporário, que passa o maior tempo sem água, especialmente em sucessivos anos de chuvas abaixo da média como ocorrido recentemente. É que a ansiada cheia do Machado representa a esperança do povo por uma boa safra de legumes, de uma pecuária sem perdas e da garantia do precioso líquido nas torneiras das milhares de residências.

            Em breve volto para a capital do Estado do Amapá levando na bagagem essa rica experiência vivida nas férias. E sei que ao passar pela orla do volumoso Rio Amazonas lembrarei do sofrido e seco Machado, esperançoso que a temporada de chuvas deste ano encha de alegria o leito daquele riacho que banha uma parte do sertão cearense.

(Imagem Google)

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

975 - O CANTO DOS SAPOS




            O sapo-cururu, no início do período das chuvas do sertão nordestino, deixa os ambientes úmidos e invade os terreiros das casas, em busca de  insetos, seu alimento preferido.  O esquisito animal, de pele rugosa, possui poucos predadores na natureza, por isso se reproduzem em grande escala.

        Próximo aos pântanos e lagoas, ouve-se repetidamente o coachar dos sapos. Os pesquisadores descobriram que a insistente vocalização, comuns aos machos, serve para marcar território e atrair as fêmeas para o acasalamento.

            No sítio Lagoas, município de Várzea Alegre, como o próprio nome sugere, repleto de pequenos lagos naturais, o canto dos conhecidos anfíbios interrompem o silêncio das noites sertanejas. Gilson Primo, conhecido produtor rural da região, bem humorado observador, não discorda dos estudiosos. O varzealegrense sustenta que o cantar dos sapos escondem um repetido e sensível diálogo. Na beira da lagoa, um dos sapos mais velhos, líder do grupo, em voz alta, emendando uma palavra na outra, pergunta:

           - Quando eu morrer quem é que vai ficar com mia muiéééééééééééé ??

            Sem pestanejar, os outros sapos do grupo, em um cantado soluço, aos pulos, respondem:

 -    É’ieu, é’ieu, é’ieu, é’ieu, é’ieu, é’ieu... 

Colaboração: Rafael Primo
(imagem Google)

sábado, 13 de janeiro de 2018

974 - CAMINHOS DO SERTÃO




         Caminhando pela zona rural de Várzea Alegre, cuidamos da nossa saúde física, realizamos uma profilática higiene mental e melhor conhecemos a nossa querida terra natal. 

         Hoje, o percurso escolhido nos rendeu um gosto especial. Eu, meu irmão Fernando, meu primo Antônio Costa e o amigo Valdin Viana, com início no fim da tarde, caminhamos por cerca de uma légua – seis quilômetros - do sítio Caldeirão à Lagoa das Panelas.

         Na antiga estrada carroçal, refizemos parte do caminho usado durante anos por camboeiros, retirantes e romeiros. Ali nos deparamos com uma cruz fincada à beira da estrada para lembrar a morte de um trabalhador, ocorrida em 1932. 

        No pouco habitado percurso, percebemos, praticamente intocadas, árvores espinhosas e outras comuns à vegetação típica da caatinga. No meio do ermo trajeto cruzamos o leito seco do Riacho do Machado, principal córrego do município cearense. 

         Na parte final da nossa atividade, no escuro da noite, no topo de uma íngreme ladeira, no sítio denominado Taba Lascada(Mulungu), paramos para descansar e beber água na residência do simpático casal Joaquim Nosa e Emília Frutuoso. Após uma rápida conversa, na despedida, da calçada alta, comentamos sobre um alvissareiro relâmpago que se repetia no poente, indicando, para nós, a chegada de uma ansiada chuva no sertão.

         Dona Emilia, nos seus 86 anos de experiência e sabedoria, desanimada por conta dos sucessivos anos de estiagem, com bom humor, retrucou:

         - Esse relampim aí é veaco, num confio nele não...

(imagem Google)