quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

725 - BAR DE NELZIN




O bar de Nelzin, situado no cruzamento da rodovia BR-230 com a Rua das Lavadeiras, em Várzea Alegre, desde a sua inauguração sempre foi um ambiente bastante frequentado. A localização privilegiada e, sobretudo, a gentileza do proprietário fazem do estabelecimento um agradável ponto de encontro dos boêmios da cidade cearense. 

Difícil é encerrar a farra e deixar o lugar, pois o humilde Nelzin costuma indagar o motivo da saída e insiste para que o freguês permaneça e tome mais algumas doses.

Na década de 1980, no inicio de uma madrugada, Nelzin já se preparava para fechar o bar quando foi vítima de um violento roubo. Um grupo que passava pela rodovia federal parou no bar e agiu inicialmente como cliente normal, bebendo bastante e pedindo varias porções de tira-gosto. Ao final, quando recebiam a conta, os bandidos sacaram armas de fogo e, mediante violência e ameaça de morte aos presentes, esvaziaram a gaveta do botequim.

O inusitado crime ganhou enorme repercussão na pacata cidade. Porém, passado o susto, o ferreiro aposentado Chico Basil e o corretor de algodão Antônio Ulisses, inseparável dupla de contadores de histórias, criaram uma versão diferente para o roubo. 

Disseram que, depois de lesionar os presentes com coronhadas, pisar sobre o rendido Nelzin  e subtrair todo o apurado, os perversos clientes deixavam o local quando foram surpreendidos pelo gentil proprietário do bar:

- E o que é que foi? Por que é que vocês já vão? Demorem mais um poquin... 

Não bastasse, os dois brincalhões ainda inventaram que, cerca de meia hora após o delito, os bandidos voltaram e bateram à porta do estabelecimento. Ao abrir, Nelzin, ainda atordoado com os golpes anteriores, tomou mais uma coronhada na cabeça e o chefe dos bandidos, citando o nome de um inveterado velhaco da cidade, gritou:

- Essa é pra você aprender a nunca mais receber cheque de fulano...


Colaboração: José Macedo de Santana
(Imagem Google)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

724 - BONS DE GARFO (Pedra de Clarianã há dois anos)



        Em um feriado prolongado da década de oitenta, os primos e amigos Antônio Ulisses e Tércio Costa viajaram juntos de Várzea Alegre para Fortaleza. No carro também foram Antônio Costa e Dirceu, filhos do corretor de algodão Antônio Ulisses.

        No município de Jaguaribe, ainda na metade do longo percurso, o engenheiro Tércio parou para o almoço em um modesto restaurante às margens da rodovia BR 116.

        Antônio Ulisses indagou por quanto o proprietário do estabelecimento alimentaria os quatro passageiros. Naquele dia de pouco movimento, aproveitando a oportunidade para ganhar uns trocados, o dono do restaurante disse que bastaria o pagamento de três refeições, pois no grupo havia duas crianças. Mesmo assim todos poderiam comer até se fartar.

        Os quatro sentaram à mesa e passaram a se servir da abundante comida. Na medida em que as tigelas esvaziavam, o dono do restaurante cuidava em trazer para os esfomeados passageiros novas guarnições de feijão, arroz, farofa e temperos diversos.

       Depois de comer bastante, Antônio Ulisses e Tércio deixaram a mesa e pediram café. Porém, para o espanto do proprietário da casa, os meninos continuaram a comer. Naquele ritmo, os apetitosos garotos raspariam as panelas e causariam prejuízo ao restaurante.

        Já cansado de tanto trazer comida, na intenção de completar com água os insaciáveis buchos dos meninos, o proprietário do estabelecimento sugeriu:

       - Vocês querem uma aguinha?

       Antônio Costa, o garoto mais velho, com a boca cheia de comida, falou:

      - Não, seu . A gente só toma água do mei pro fim. Mas pode trazer uma pimentinha pra mode nós enfezar a língua...



Colaboração: Irapuan Costa

(imagem Google)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

723 - CONTANDO NOS DEDOS




 
A vida tranquila do interior permite comportamentos impossíveis de se repetir nos grandes centros urbanos. Pela rotina, nas pequenas cidades, os moradores mais atentos facilmente percebem uma movimentação diferente ou uma atitude incomum.

Em mais uma manhã do inicio da década de oitenta, em Várzea Alegre, sertão cearense, os amigos Antônio Ulisses, José Macedo, Chico Basil, Cezar Costa e Tércio Costa bebiam na calcada do Bar de Jonas Morais. Em vários momentos do animado encontro, o corretor de algodão Antônio Ulisses interrompia o divertido assunto em pauta e indagava a Chico Basil:

- Chico, quantas já?

O ferreiro aposentado, sem pestanejar, respondia:

- Na mīa conta já vai em três...

A contagem prosseguiu até que pela quinta vez, o executivo do grupo Edson Queiroz, José Macedo, em férias por Várzea alegre, não controlou a curiosidade e indagou ao velho ferreiro:

- Peba véi*, que conta é essa que vocês tanto fazem?

O ferreiro Chico Basil, apontando para José Saraiva da Cruz, policial militar da reserva, que, a passos largos e arrumando os óculos no rosto, caminhava pela Rua dos Perus, explicou:

- Tá veno ali. Toda vez que dá vontade de bebê uma cana, Saraiva tem o trabai de fechá o bar dele no Calçadão e vai tumá uma lá no bar de Nelzin. É o dia todin. Pode anotá. Cada vez que passa subino aqui é uma dose...


* apelido atribuído por Antônio Ulisses a Chico Basil
Colaboração: José Macedo de Santana
(Imagem Google)

sábado, 23 de fevereiro de 2013

722 - SEDUTOR

 
 



     Em recente matéria do Jornal Folha de São Paulo, o especialista Richard La Ruina, autor do livro a A Arte Natural da Sedução, sustenta que qualquer homem é capaz de conquistar uma mulher, independente de sua aparência, situação financeira ou desinibição.

     Mas nem todos preferem os caminhos mais simples e diretos. Alguns abusam do uso das palavras, não conseguindo apresentar seu desejo claramente.

     Certa vez, no início da década de 1990, em Macapá, em uma mesa do artigo Bar Lennon, um velho conhecido, que se dizia hábil e eficiente na arte de seduzir e conquistar mulheres, desejando impressionar uma jovem que conhecera recentemente, falou:

     - Consinta-me oscular em seu pavilhão auricular...

     A moça, sem nada entender, sorriu para os demais presentes e perguntou:

     - Mano, eu num entendi nada. Ele tá doido? O que é que ele disse mesmo?

      Eu, buscando facilitar a vida do prolixo amigo, imediatamente traduzi:

      - Minha filha, no português rasteiro, acho que ele quer tascar um chêro nas sua zurêa...


(imagem Google)

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

721 - OS MENINOS E O JUMENTO



     Há algumas décadas, especialmente nas manhãs de sábado, dia de feira, Várzea Alegre era tomada por cavalos, burros e jumentos, à época o meio de transporte mais utilizado pela população do município cearense.

     Enquanto os seus proprietários realizavam compras e tomavam umas doses de cachaças no Mercado Velho, os animais permaneciam amarrados em árvores e cercas, ou até mesmo soltos e pastando em vias não pavimentadas e de pouco movimento.

     Em uma manhã de sábado da década de sessenta, um cidadão passou por um beco ao lado da Prefeitura Municipal, hoje Rua Maria Vitória, e observou o funcionário público Manoel Bezerra gritando da janela do oitão da antiga casa onde morava:

     - Sai daí jumento! Sai daí...

     Vendo a situação, o homem ponderou:

     - Seu Manelzin, o sinhô tá gritando com esse jumento? N’era mió brigar com os seus minino?

     O funcionário público apontou para seus filhos Huygnes, Adail, Herbet, Hélvio Sérgio e Helanio, que mexiam no animal, e disse:

     - É mais fácil o jumento me atender que esses meninos. Tou vendo a hora é levarem um coice...


Colaboração: José Gonçalves de Souza e Helanio Bezerra de Carvalho.

(imagem Google)

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

720 - FIM DAS RUGAS



     A cada dia as pessoas buscam novas fórmulas e modernas técnicas para combater o envelhecimento. Cremes milagrosos são propagandeados, cirurgias plásticas são realizadas, comprimidos revigorantes são lançados. Tudo para diminuir as implacáveis marcas do tempo.

      Certo dia, na década de oitenta, na tranquila Várzea Alegre, o corretor de algodão Antônio Ulisses, o ferreiro aposentado Chico Basil e outras pessoas bebiam na calçada do Bar de Maria Araripe, no início da Rua dos Perus, quando o assunto da busca pelo rejuvenescimento veio à tona na divertida roda de amigos.

     O corretor de algodão, buscando provocar a aguçada espirituosidade do velho ferreiro, perguntou:

     - Chico, agora a pessoa que tem dinheiro só fica com a cara engilhada se quiser. O que tu acha dessas muié toda plastificada?

     Chico Basil tomou uma dose de cachaça, esfregou uma mão na outra e respondeu para o inseparável companheiro de farra:

     - Tõe Lisse, num adianta miorá a flandagem e o motô continuá rim.



(imagem Google)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

719 - CÉU DO SERTÃO





Olhar para o céu, em direção ao nascente, com a mão protegendo os olhos dos fortes raios solares, buscando algum sinal de chuva, trata-se de um dos gestos mais repetidos pelo nordestino do sertão.

Na cidade de Várzea Alegre, interior cearense, em um fim de tarde de meados do século passado, durante um longo e sofrido período de estiagem, o comerciante conhecido como Chico Cego, do muro da sua casa, gritava sempre para a vizinha:

- Maria Amélia, espie aí pro nascente pra ver se tem algum preparo...

A professora Maria Amélia olhava para o alto e, lembrando a pureza da mãe do menino Jesus, respondia ao primo de seu esposo Antônio Costa:

- Chico, o céu tá todo azul, limpo que só o coração de Maria...


Colaboração: Terezinha Costa Cavalcante

(imagem Google)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

718 - PAU DE GALINHEIRO



 

No sertão nordestino, o tratamento para o pinto (filhote da galinha) fraco era simples e eficiente. Bastava colocá-lo embaixo de uma cuia e bater até a pequena ave recuperar as forças e ressuscitar.


Em uma quarta-feira de cinzas da década de 80, na cidade cearense de Várzea Alegre, após uma noite de muita folia, o jovem Julio Bastos Leandro chegou a sua casa pela manhã com um Pau de Galinheiro nos ombros. Ainda na porta, Delmir, sua preocupada mãe, perguntou:


- Julin, onde você arrumou tanta galinha? 


O folião, ainda sob o efeito da bebida consumida na madrugada, respondeu:


- Mãe, eu comprei lá no Calçadão* pra senhora fazer um caldo pra nós...


No fogão, Delmir já preparava para o almoço de cinzas uma panela com outra galinha caipira trazida do sítio Rosário. Após alguns minutos, Julin entrou na cozinha e disse: 


- Mãe, que barulho é esse? Por que a senhora batendo nessa cuia?


- Meu fi, tou tentado ver se essas galinha num morre, elas tão fracas, parece que tão cum gôgo**...


- Num adianta mais não, mãe. Eu já trouxe elas de pescoço puxado pra senhora num ter trabalho...




* Calçadão Antônio Alves Costa, área de lazer de Várzea Alegre.

** nome popular da Coriza Infecciosa, doença que acomete as galinhas.


(imagem Google)


Colaboração: Júlio Bastos Leandro

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

717 - EMBORCANDO O CÁGADO





Segundo pesquisas, a falta de desejo sexual é uma das disfunções mais frequentes e chega a acometer entre 15 a 34% das mulheres. Tem diversas causas, entre elas as mais comuns são alterações hormonais provocadas por uso de diversos medicamentos, pelo parto, amamentação e menopausa.

Recentemente, passeando pelo centro comercial de Várzea Alegre, reencontrei um amigo mais velho e fiz aquelas perguntas de sempre. Indaguei como andava a vida, o trabalho, o casamento. O velho conterrâneo me respondeu sem muito entusiasmo:

- Flavin, a vida boa, mas o casamento é que marromeno...

- E o que é que houve? – perguntei inocentemente.

O velho amigo, referindo-se a perda da libido pela sua madura esposa, com o hábito sertanejo da linguagem figurada, completou:

- A muiéde casa emboicou o cago*...


* referência ao cágado, nome comum a várias espécies de quelônios de água doce.

(imagem Google)