sexta-feira, 29 de junho de 2012

617 - BRANCA DE NEVE E OS CEARENSES




A altura média do cearense, especialmente no sertão, sempre foi uma das menores do Brasil, o que tornou essa característica, ao lado da cabeça grande, um dos atributos físicos identificadores dos naturais do Ceará. Contudo, a pequena estatura nunca impediu os esforçados e destemidos cearenses de alçar vôos e conquistar posições pelo mundo inteiro.

Em certa tarde de domingo do final da década de 1990, o varzealegrense Francisco Tadeu Fiúza, conhecido como Darlan, na companhia de vários conterrâneos, passeava pela famosa Avenida Beira Mar, em Fortaleza, tomando umas caipirinhas e curtindo a beleza do local. Em dado momento, ao cruzar com um travesti que rebolava exageradamente pelo calçadão, o irreverente e baixinho Darlan, com flagrante ironia, brincou:

- Hummmm. Que gostosa, emmm?

O travesti,  imediatamente se virou para o grupo de rapazes, e, fixando o olhar para o pequeno Darlan, falou:

- Ei fofinho, e a Branca de Neve como vai? Manda um abraço pra ela, ?


Colaboração: Ropson Frutuoso Bezerra
(imagem Google)

terça-feira, 26 de junho de 2012

616 - "MOITEL" (Pedra de Clarianã há dois anos)




          Em meados do século passado a iniciação sexual dos jovens era bem mais tardia, difícil e arriscada. Além da pouca informação sobre o tema, o mundo ainda não passara pela liberação das últimas décadas, quando surgiram novos e eficientes métodos anticoncepcionais e de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis.

        Contam em Várzea Alegre que na década de 1950, um jovem rapaz com os hormônios fervendo, depois de muita insistência, conseguiu marcar um encontro amoroso com uma mulher mais velha e liberada.

        Como ainda não existiam os convenientes motéis, o lugar sugerido pela mulher para as intimidades foi o interior de uma grande roça localizada nas imediações da pequena cidade.

         Assim, no dia marcado, no início da noite, o rapaz se dirigiu ao local indicado. Desajeitado, pulou algumas cercas e atravessou uma mata de jurema e outras árvores espinhosas.

         Ao encontrar a desejada mulher em um pequeno descampado, o jovem, ainda ofegante, com as calças impregnadas de carrapichos foi longo retirando a fivela do cinto e desabotoando os botões da braguilha.

          Contudo, a experiente mulher, com um riso irônico, apresentando desculpa pouco plausível, jogando água fria na quentura do desesperado rapaz, disse:

          - Péra minino, largue de ser avexado. Hoje vim só pra mostrar o lugar.


(imagem Google)

sábado, 23 de junho de 2012

615 - A SOMA DO VIAGRA


Há alguns anos, em mais uma calorosa tarde de Belém, dois velhos amigos se encontraram no secular mercado Ver-o-Peso. Apreciando a bela vista da Baía do Guajará e bebendo cerveja marca Cerpa, passaram a conversar sobre vários assuntos. Em dado momento o agradável papo foi interrompido por uma tradicional vendedora que passou gritando e oferecendo ervas afrodisíacas:

- Olha o viagra natural. Levanta até defunto, que dirá o resto...

 Aproveitado a propaganda da feirante, um amigo, sexagenário, perguntou ao outro:

- Você já provou o tal do comprimido de viagra? É bom mesmo?

- Provei sim. Olha como foi. – respondeu o velho homem levantando um dedo de uma mão e os cinco dedos da outra.

- Deu seis. Que beleza, mano! – exclamou o admirado amigo.

Porém, o provador do famoso comprimido azul dessa vez mostrou inicialmente o dedo da mão esquerda e disse:

- Que nada, foi só uma...

Em seguida, também mostrando os outros cinco dedos, movimentando a mão direita pra frente e para trás, completou calmamente:

- E beeeeeeem devagarinho...


Colaboração: Eli Pinheiro

(imagem Google)

quarta-feira, 20 de junho de 2012

614 - A FORÇA DA VERDADE (Pedra de Clarianã há dois anos)




     Há um provérbio francês que diz: apenas a verdade ofende. Outro, iugoslavo, vai mais adiante e aconselha: diga a verdade e saia correndo. Pelas sentenças populares fica claro que o que não somos pouco nos incomoda.

     Meu primo José Costa Neto sofria de um grave problema na visão. Seus óculos eram do tipo “fundo de garrafa”, com mais de dez graus de correção em cada lente. Antes de dormir colocava os óculos embaixo da sua “cama de campanha”. Ao acordar, buscava o pince-nez* tateando o chão.

     Costa, como conhecido, por muitos anos morou em Fortaleza com minha avó Maria Amélia. Certa noite, na década de setenta, voltava à pé de uma animada tertúlia quando um bêbado lhe abordou pedindo dinheiro. Como não foi atendido, o inconveniente pedinte vociferou:

         - Você é um baitola, ladrão, corno, marginal...

      Costa, impassível, ouvia tranquilo as agressões verbais. Até que o pedinte disse:

        - E também é um cego sem vergonha.

     Nesse momento Costa perdeu a compostura, arregaçou as mangas da camisa e partiu para cima do bêbado, gritando:

        - Cego não. Agora você me ofendeu.



* palavra francesa que originalmente significa óculos sem haste em que uma mola prende ao nariz mas usada no Ceará como sinônimo para todos os tipos óculos.

(imagem Google)

domingo, 17 de junho de 2012

613 - FEIRA DE SÃO CRISTÓVÃO


Neste domingo de sol, em tempos de Rio + 20, e ainda com a concorrência do Cristo Redentor, do Pão de Açúcar, do Jardim Botânico, da Praia de Copacabana e de outros famosos e belos pontos turísticos do Rio de Janeiro, eu, cearense do sertão, no período dos folguedos juninos, preferi um outro lugar.

Caminhando entre cerca de setecentas barracas, assistindo às apresentações de forró e quadrilhas, visitei o Centro Municipal de Tradições Nordestinas Luiz Gonzaga, também conhecido como Feira dos Nordestinos, de São Cristóvão ou, especialmente pelos cariocas, Feira dos Paraíbas.

Naquele imenso espaço reservado à cultura do povo do nordeste brasileiro há fortes lembranças a expoentes personagens da região. Além de Luiz Gonzaga, são homenageados Patativa do Assaré, Jackson do Pandeiro, Padre Cícero e outros.

Ali também são oferecidas várias comidas típicas do nordeste, como buchada de bode, arrumadinho e galinha caipira. No restaurante Estação Baião de Dois eu pedi o prato que dá nome ao estabelecimento, que veio acompanhado por carne de sol e paçoca de carne seca, tudo temperado pela deliciosa manteiga da terra - ou de garrafa. Embora diferente do divino baião costumeiramente preparado por minha mãe Terezinha eu apreciei a comida da feira.

No meio do passeio, em um cartaz pregado em uma das barracas, li uns versos do paraibano José João dos Santos - mestre Azulão - que resume o espírito do lugar. O cantador e repentista Azulão, radicado no Rio de Janeiro há várias décadas,  e um dos principais fundadores da Feira de São Cristóvão, assim escreveu:

No Brasil de Sul a Norte
Seja em quaisquer região
Aonde tem nordestino
Tem forró e tem São João”


(imagem Google)

sábado, 16 de junho de 2012

612 - OS CARNÊS DE CHICO NENEN




Nas últimas semanas, os jornais noticiaram o esgotamento da capacidade de endividamento dos brasileiros. Estimulando o consumo, o excesso de crédito oferecido nos últimos anos consumiram expressiva parcela do potencial financeiro da família brasileira.

Mas em muitos lares do país essa situação de comprometimento monetário não é nenhuma novidade.

No fim da década de noventa, o professor Paulo Danúbio  foi a São Bernando do Campo visitar o seu querido irmão Francisco das Chagas, conhecido como Chico Nenen, que migrara anos antes para o sul maravilha. Naquela época, Chico, empregado da Brastemp, aproveitando a estabilidade da moeda e facilidade do crédito, comprou e reformou uma casa em um morro do bairro Ferrazópolis, adquiriu móveis novos  e guarneceu toda sua residência.

Ao saber que o irmão fizera vários financiamentos, o controlado professor perguntou:

- Chico, você é assalariado como eu. Como é que você faz pra pagar desse tanto de conta?

espirituoso Francisco das Chagas, sentado em um sofá novo da sala reformada, sem tirar o olho de um programa que passava na nova televisão, com sua voz grossa, falou pausadamente:

- Meu irmão, quando sai o pagamento eu meto a mão num saco grande esborrotano de carnê e pego o sortudo que vou pagar naquele mês...


(imagem Google)

sexta-feira, 15 de junho de 2012

611 - "POLIGROTA" (Pedra de Clarianã há dois anos)




     
Eu sempre sofri no aprendizado das línguas estrangeiras. Claro que falta disciplina e perseverança, mas já iniciei o estudo em cursinhos especializados por diversas vezes e não consigo avançar.

     Buscando justificar a acentuada dificuldade com os idiomas, remonto ao período da minha infância, na isolada Várzea Alegre. Se hoje o inglês controla a internet, fala nos filmes, toca nos videoclips, naquela época era raro o contato do cearense do interior com outra língua. 

     Na minha querida cidade natal os velhos rádios só tocavam musicais nacionais. O Cine Alvorada projetava apenas filmes dublados. Era muito mais fácil encontrar um extraterrestre do que um estrangeiro caminhando pelas terras secas do interior cearense.

     Na sala de aula do Centro Educacional São Raimundo Nonato, no antigo primeiro grau, nossa professora Terezinha Rolim se esforçava para ensinar a língua da terra do tio Sam. Numa das lições, a mestre perguntou:

      - Quem sabe traduzir a frase Mary is girl ?

     O irreverente aluno "Airton de Senhor", sem pestanejar, levantou a mão e respondeu:

     - Maria de Zé Miguel.



(imagem Google)

terça-feira, 12 de junho de 2012

610 - PAU DE ARARA MODERNO (Pedra de Clarianã há dois anos)






      Desde que, no ano de 1906, em Paris, o brasileiro Santos Dumont apresentou o seu 14 Bis, o homem não mais parou de voar. Com o desenvolvimento da aviação comercial, o transporte aéreo se apresentou inicialmente como uma opção restrita e de luxo. Pelo seu altíssimo preço, a grande maioria da população não tinha acesso ao meio de deslocamento rápido e eficiente.

      No Brasil, a precariedade de outros meios de transporte e as recentes mudanças na economia fizeram com que a aviação comercial alcançasse uma expansão excepcional no país. O cearense do sertão, que por muitas décadas viajou para o sudeste em desconfortáveis caminhões pau-de-arara, passou a contar com a rápida opção dos aviões.

      Na década de noventa, a varzealegrense Dalva ganhou uma passagem de avião entre Juazeiro do Norte e São Paulo para visitar seus filhos que moram no sudeste. No dia da ansiada viagem, Carlos Leandro da Silva, conhecido como Carlin de Dalva, se encarregou de levar sua querida mãe até o aeroporto da vizinha terra de Padin Ciço. Observando certo nervosismo na turista, Carlin buscou descontrair a passageira de primeira viagem:

      - Mãe, num vá abrir lata de farofa de galinha nem descascar laranja dentro do avião não. Eles dão merenda lá.

      Na despedida, quando sua simples e querida mãe se preparava para entrar na sala de embarque, Carlin exclamou:

      - Mãe, quem já foi avião!!!!!!!!


(imagem Google)

sábado, 9 de junho de 2012

609 - O APETITE DOS VIAJANTES




No início da década de oitenta, o comerciante Alberto Siebra e o corretor de algodão Antônio Ulisses decidiram passear em Fortaleza. No dia marcado, cedo da manhã, em um veículo marca Ford modelo Belina, os dois amigos deixaram a pequena cidade de Várzea Alegre com destino à capital cearense.

Por volta das onze horas, no meio do trajeto da longa viagem, às margens da rodovia BR 116, na região do Jaguaribe, os viajantes pararam para o ansiado almoço. Escolheram um restaurante simples, sem luxo, preferido pelos fartos caminhoneiros que transitavam pela estrada.

Ao sentar à mesa, o apetitoso Alberto chamou o dono do restaurante e disse:

- Vamo fazer um empleita*. Você vai trazeno o que tiver aí na cozinha e nós vamo comendo.

O também comilão Antônio Ulisses completou:

- Num deixe esvaziar os prato da mesa.

Com o almoço servido os dois gordos amigos começaram a comer sem parar. Como acertado, o garçom lutava pra não deixar prato vazio na mesa. A toda hora, Antônio Ulisses e Alberto faziam um sinal para o atendente do restaurante e pediam:

- Traga mais um arroizin...

Após cerca de meia hora, o dono e também cozinheiro, sem dar conta do apetite dos varzealegrenses, preocupado com a chegada dos vários caminhoneiros e fregueses habituais, chamou o garçom em um canto e pediu:

- Vai faltar comida pro outros freguês. Vá lá e leve doce de leite e uma garrafa d’água pra ver se enche os bucho daqueles dois.

Mal o gargom se aproximou da mesa com a bandeja com um garrafão de água e tigelas com doce de leite, Antônio Ulisses, com a boca cheia, olhou pra Alberto, sorriu e falou:

- Carece agora não. Doce e água a gente só quer do mei pro fim....


*empreitada
Colaboração: Ropson Frutuoso Bezerra
(imagem Google)

sexta-feira, 8 de junho de 2012

608 - FILHO DE PEIXE (Pedra de Clarianã há dois anos)



        Filho primogênito do médico José Iran Costa e da educadora Laís Iolanda, desde os tempos de criança Iran Junior nunca tentou se prevalecer da posição destacada dos seus pais na pequena e modesta Várzea Alegre. Mas, atento aos bons exemplos e ensinamentos da família, inspirado nos passos do querido pai, o menino se tornou um conceituado médico na cidade de Recife.


       Em uma manhã de domingo do início da década de setenta, em uma roça do Bairro Betânia, o pequeno Iran Junior brincava perigosamente próximo a um jumento. Passava pelo local e viu a perigosa cena, José de Sousa Lima, Pé Véi, varzealegrense simples e de tiradas originais. Imediatamente, o espirituoso morador de Fatico gritou:


       - Menino, sai detrás desse jumento. Ele num sabe que tu é fii de dotô Iran não.



(imagem Google)

terça-feira, 5 de junho de 2012

607 - O INIMIGO DE CUIÚ




Certo dia, em Várzea Alegre, o conhecido cambista de apelido Cuiú conversava com amigos em uma mesa do tradicional bar de Zé de Zuza quando por ali passou um outro morador da pequena cidade do sertão cearense. Percebendo que o cambista virara a cara para o cidadão que passava, um dos presentes perguntou:

- Cuiú, por que você num gosta dele?

Para representar sua pouca afeição pelo conterrâneo, o espirituoso cambista contou uma história. Disse que um leão vivia preso em uma bola de arame farpado e sonhava sair daquela jaula para comer tudo que aparecesse à sua frente. Finalmente, o temido felino conseguiu fugir e encontrou um sapo cururu. Não deu outra. Imediatamente comeu o grande e esquisito batráquio. Mais adiante, o leão faminto se deparou e também engoliu de uma só vez o desafeto do cambista. Porém, mal andou por  duas braças, o felino sentiu o estômago embrulhar. Parou, pôs as patas da barriga e pensou alto:

-  Ai meu Deus. Será se esse caba rim vai fazê eu perdê meu cururu?

Colaboração: Antônio Gerson Morais (Piroxa)
(imagem Google)

domingo, 3 de junho de 2012

606 - BAIXIN




Baixinho, gordo e careca serão sempre pontos de referência em meio a multidão. Para mudar essa situação o gordo pode encarar um sofrível e difícil regime. Mas, para os dois outros, as soluções são provisórias e contestáveis, como sapato com salto embutido e peruca. Assim, a melhor alternativa é encarar a realidade com alegria e bom humor.

Em Várzea Alegre, principalmente nos feriados, o Mudo de Zé Peru, folclórico personagem da cidade do sertão cearense, quando se encontra com meu irmão Luiz Fernando, põe a mão à altura do peito, indicando com o gesto a minha pequena estatura, e, forçando a voz, pergunta:

- Tadêêê? Tôtôssin ?

Mas já me adaptei e me conformei com esses comentários. No início da década de 1990, após concurso público, assumi o cargo de Delegado de Polícia no acolhedor Estado Amapá. Investido na autoridade, exercendo importante função, com um revólver na cintura, eu me imaginava bem mais alto. Até que um dia um cidadão entrou na delegacia, bateu no meu ombro e perguntou:

- Ei, Baixin.  Cadê o Delegado?


(imagem Google)

sexta-feira, 1 de junho de 2012

605 - AGIOTA




Anos atrás, um afoito e desorganizado varzealegrense se atolou em dívidas, tomando dinheiro emprestado de agiotas. Sem mais se incomodar com os extorsivos juros cobrados, apanhava dinheiro de um para pagar outro.

Em pouco tempo as contas cresceram tanto que havia fila de cobradores em sua casa. O devedor então resolveu convidar todos seus credores para uma reunião.

No dia e hora marcados, com mais de uma dúzia de agiotas reunidos, o devedor chegou e foi logo dizendo:

- Eu chamei vocês aqui porque tou mais quebrado que arroz de terceira. Num tenho condição de pagar a todo mundo duma vez não. Vou fazer um sorteio pra escolher aquele que vou começar pagano primeiro.

Enquanto o devedor anotava os nomes dos presentes em um pedaços de papel, um dos credores se levantou e passou a proferr impropérios:

- Você é um veaco, um caloteiro fela da puta. pensano que eu sou burro, jumento ou sem lá o quê? Se num quer pagar diga logo, deixe de conversa fiada...

         Sem interromper as anotações no papel, o endividado varzelegrense olhou para o enfurecido agiota e, com calma, recomendou:

- Hômi, se aquete aí. Desse jeito num vou nem botar seu nome no saco...


Colaboração: Ropson Frutuoso Bezerra
(imagem Google)