quarta-feira, 29 de julho de 2009

65 - O CARREGADOR DE PINICO

           Há cinqüenta anos, poucas residências possuíam em seu interior banheiros e, por conseguinte, vasos sanitários. As convenientes suítes eram praticamente desconhecidas naquela época, sobretudo em pequenas cidades do interior cearense, como Várzea Alegre, onde ainda não havia, sequer, a cômoda água encanada.

          O banheiro da casa da Rua Duque de Caxias, como em todas as outras residências, era localizado bem no fundo do quintal. Seu acesso era bastante difícil, principalmente à noite, pois no trajeto era necessário descer vários degraus de escada.

          Rosa Amélia, irmã mais velha, durante o período noturno, após o dia de estafante trabalho, fazia suas necessidades em um penico. Logo pela manhã, encarregava Antônio Ulisses, ainda menino, de jogar os dejetos na distante cintrina, sob a promessa de pagar-lhe alguns tostões.

          Na época, Rosa Amélia, jovem e bonita, trabalhava no estabelecimento comercial de propriedade dos seus primos Toim e Joãozinho Costa, próximo da residência da rua Duque de Caxias, onde atualmente funciona o Armazém Itaúna, de Fabiana Menezes Costa. Antônio Ulisses, como não recebia o pagamento pela desagradável tarefa de transportar o penico e seu conteúdo para a retrete, ia para a porta do estabelecimento comercial de vendas de tecidos e, caminhando na calçada da loja, ameaçava sua irmã, falando:

         — Se não me pagar o que me prometeu, eu digo.

         Com isso, Rosa Amélia, mocinha nova, nervosa e envergonhada, cheia de pudores, sabedora das peraltices e da coragem de seu mano, cuidava logo de quitar tal dívida, sob pena de o irmão trazer a público o melindroso episódio do penico.



* extraído do livro “Conte Essa, Conte Aquela – Histórias de Antônio Ulisses”

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