sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

285 - A PENHORA




         Vários desses percursos, Antônio Ulisses fez acompanhado de Francisco Basil de Oliveira, o ferreiro Chico Basil, amigo de várias décadas. Os dois, por muito tempo, formaram uma perfeita dupla de contadores de “causos”. Hoje em dia, Chico diz a todos que perdeu o seu porta-voz, pois era Antônio Ulisses que dizia:

         — Conta essa, conta aquela - instigando a memória do ferreiro.

         Uma dessas histórias bem narradas ocorreu quando foram levar a Belina de seu Dirceu para uma oficina de Iguatu, pois o automóvel sofrera avarias decorrentes de um abalroamento. Dentro de uma pasta ia o dinheiro destinado ao pagamento da oficina e das despesas da viagem.

        Depois de deixar o carro no lanterneiro, os dois aproveitaram para ir à agência do Banco do Brasil receber o “PASEP” de Antônio Ulisses. Na casa bancária, o próprio Antônio Ulisses retirou da pasta os documentos pessoais para comprovar o direito ao benefício devido aos servidores públicos. Porém, para sua decepção, a quantia ainda não estava disponível.

        Como de praxe, ao deixarem o banco, seguiram para o pequeno comércio de uma típica vendedora de tapiocas. Ali, os dois, bastante esfomeados, saborearam várias daquelas deliciosas comidas típicas, recheadas com carne batida e beberam algumas xícaras de café.

         Saciado, Antônio Ulisses abriu a pasta para apanhar o dinheiro e quitar a conta da farta merenda. Mas, para sua decepção, quando mexera na pasta anteriormente, deixara cair toda a importância trazida na viagem. Da volumosa quantia levada, não restou um tostão sequer.

         Ainda atordoado e sem saber o que fazer, Antônio Ulisses se dirigiu a tapioqueira, dizendo:

         — Senhora, um loirão assim como eu não vai lhe enganar. Nem vou contar que perdi o dinheiro que a senhora não vai acreditar. Também não vou deixar meu relógio como garantia. Mas, pra que a senhora não desconfie, esse caboclinho aqui vai ficar penhorado até eu voltar com o dinheiro para pagar a despesa.

         Enquanto esteve aguardando a chegada do dinheiro para saldar a dívida, a vendedora, mesmo lavando as xícaras, não desviava o olhar de Chico. Este, já melindrado com aquela desconfiança da vendedora, falou:

         — Senhora, não se preocupe, pode lavar sua louça em paz. Eu não vou sair daqui correndo.

         Assim, Chico Basil ficou penhorado na tapioqueira até que, horas depois, Antônio Ulisses voltasse com o dinheiro emprestado de Raimundo Crispin, um conhecido que fazia linha para cidade de Iguatu. Saldada a dívida e levantada a incomum penhora, os dois amigos saíram juntos já rindo da inusitada situação.


*Extraído do Livro “Conte Essa, Conte Aquela – Histórias de Antônio Ulisses”

Ilustração: Edricy França

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